Uma das características que diferencia a literatura de fantasia alta e a de espada e feitiçaria (sword & sorcery) é a motivação dos personagens na história e seu escopo. Enquanto na primeira, os protagonistas visam uma missão grandiosa, com objetivos nobres e altruísticos (como salvar o mundo, libertar a galáxia de um império maligno), no outro gênero os personagens são guiados mais por objetivos particulares, mais comuns ao homem do dia a dia (como salvar uma pessoa amada, conseguir uma espada poderosa, obter ouro, se vingar).
Ao contrário do que muitos pensam, o RPG de fantasia surgiu influenciado não por uma literatura de fantasia alta (como o Senhor dos Anéis), mas por livros de
espada e feitiçaria, como os de Robert E. Howard, Edgar R. Burroughs, Fritz Lieber, entre outros. Seus heróis não estavam fazendo aquilo simplesmente por um grande ideal nobre, mas por interesses próprios, algo que todos nós temos.
Então, por que não trazer isso para os nosso jogos? Por que não fazer personagens com essas ambições mais humanas, defeitos e fraquezas que os torne mais reais. Essas motivações mais mundanas também faz com que o personagem tenha algo concreto a conquistar, que não seja algo intangível e distante como a salvação, a paz ou algo parecido. Isso serve tanto para personagens dos jogadores, quanto para NPCs, principalmente vilões. Quem por aí já está cansado de vilões que querem destruir, dominar, cobrir de sombras, ou qualquer outro verbo ruim, o mundo?
Imagine um grupo que esteja unido em uma aventura apenas por interesses pessoais que puderam se conjugar. Talvez naquela ruína esquecida se esconda o assassino do pai do guerreiro do grupo, o símbolo sagrado de Amanthar que pertenceu ao Sumo-Sacerdote que fora escolhido pelo próprio Deus e ajudaria muito o clérigo errante do grupo a reestabelecer o respeito dentro de sua ordem, um tomo de magia que esconde segredos mágicos capaz de dar ao mago do grupo o poder que deseja para mostrar àqueles que duvidaram de sua capacidade na Academia Arcana, e, por fim, ouro o suficiente para garantir o conforto que o ladrão do grupo deseja. Parecem motivos bobos, mas são motivos que são facilmente assimilados e que podem ser projetados em quase qualquer pessoa.
E essas estórias não precisam parar por aí. Esses objetivos pessoais são substituídos o longo do tempo, quando, depois de se vingar do orc que matou sua família, o guerreiro descobre que aquilo foi planejado por um reino vizinho que quis enfraquecer a região próxima para aumentar sua influência militar. Ou quando o ouro do ladrão do grupo acaba e ele descobre um mapa onde mais tesouros pode ser encontrado e busca a ajuda de seus velhos companheiros. Ou quando o mago percebe que algo deu errado em sua conjuração e agora precisa de ajuda para controlar o mal que libertou das profundezas para que ele consiga controlar seus poderes.
Além disso, um outro jeito de deixar as coisas mais pessoais é o mestre afetar a vida particular de personagens na aventura. A comunidade atacada é aquela em que cresceram. A donzela em apuros é aquela pela qual dois dos personagens são apaixonados secretamente. O pai de um dos aventureiros desaparece de forma misteriosa junto com outras pessoas, e o irmão do mago se volta para o mal. Pode até parecer que é uma maneira de forçar a ação dos jogadores, e pode até ser, mas é um meio de envolvê-los mais a fundo na estória. Fazer com que realmente se sintam motivados e permitir que cenas mais dramáticas possam ocorrer, quando tiverem que decidir entre algo que é importante para eles e algo que é importante para a maioria.
É claro que esses objetivos mais "mundanos", menos "épicos", não precisam fazer que as aventuras não lidem com outras questões maiores. Elas podem sim ser inseridas em outros contextos, que envolvam mais cosias que os interesses pessoas dos protagonistas. A pessoa a ser salva, que por coinscidência é a mulher amada de um dos companheiros do grupo, será sacrificada para acordar um Deus maligno adormecido. Ou o tesouro roubado, que é herança do cavaleiro está nas mãos de um Rei Tirano que planeja trazer todo o norte sobre seu poder. O objetivo é fazer com que os personagens tenham motivações mais cotidianas, que façam com que nos identifiquemos com eles.
Enfim, muitas vezes nos esquecemos que os personagens que criamos são, antes de tudo, pessoas. São heróis capazes de mudar o destino do mundo, mas eles possuem sentimentos e ambições tão humanas como a de qualquer um de nós, e trazes isso a tona para o jogo pode enriquecê-lo bastante. Mostrar que eles são afetados quando pessoas próximas a eles, ou coisas queridas são ameaçadas, fazendo-os questionar se vale a pena sacrificar aquilo por um bem maior, só ajudará a estória a se tornar mais rica.
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Diogo, só um toque: "capa e espada" é diferente de "sword & sorcery" (que pode ser traduzido como "espada e feitiçaria" ou "espada e magia"). É uma confusão comum, porque até pouco tempo atrás não se fazia diferenciação entre gêneros de fantasia no Brasil.
ResponderExcluirEu sabia que a tradução não estava correta, mas achava que era esse o termo que usavam por aqui.
ExcluirAlguns mestres são contra usarem problemas pessoais dos jogadores nas mesas de jogo! Eu cheguei a fazer isso uma vez e envolvi muito meus jogadores na estoria!
ResponderExcluirPor exemplo, Jogadores mais tímidos tinham como missão liderar o grupo e fazer escolhas que colocava a vida de todos em riscos. Tirar todo poder de jogadores que tinham um grande problema com ego e dar muito poder há jogadores com baixa estima!
Criar NPCs com jeitos e nomes parecidos com o de pessoas que os jogadores se relacionavam fora da mesa.
E em uma das minhas aventuras dei a missao para o grupo que era recuperar os filhos do ferreiro, que teria sumido próximo ao um mausoléu, um dos jogadores deste grupo estava a procura do irmão que teria desaparecido perto daquela região.Quando eles entraram no mausoléu o irmão do personagem tinha capturado as crianças para um ritual.A missao acabou com as crianças mortas e os jogadores indo atrás do irmão que tinha completado um ritual onde ele se transformou em um lich ;D
Mais um sucesso decisivo hein Diogo? Há muito tempo eu uso o mantra ensinado pelo Santo Bob Cano-Duplo para as minhas campanhas. Até mesmo em jogos mais épicos, uma história focada nos personagens tem sido mais legal. De vez em quando um déspota que quer governar o universo é legal, mas na maioria das vezes gosto mais de ter focos diferentes. =D
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