segunda-feira, 24 de setembro de 2012

Economia nos Mundos de Fantasia

É muito comum em aventuras os personagens encontraram de posso dos monstros uma grande quantidade de moedas de ouro, prata e cobre. Ou mesmo encontrar orcs e goblins nos corredores de uma masmorra, e esses estarem carregando, cada um, algumas moedas nas suas sacolas. Afinal, essa é uma das principais maneira de recompensar os aventureiros por suas empreitadas, com ouro. E eles precisa dessas, e outras recompensas, se não, afinal, por que eles estariam se aventurando.

Mas vamos parar para pensar um pouco mais sobre como estamos apresentando esses tesouros. Estamos falando de jogos que se passam em um mundo medieval fantástico, com uma tecnologia, sociedade e economia, que, teoricamente, seriam medievais, não é? Assim, devemos pensar em que escala são usadas moedas de metais preciosos nesses mundos, como elas são produzidas, em que quantidade, quem as produz e como esses monstros conseguiram acumular tantas delas.

A grande maioria dos mundos de fantasia são inspirados na Europa Medieval e Feudal, onde a população é principalmente composta de serviçais, plebeus, fazendeiros e artesões, pessoas que raramente veem uma moeda de ouro ou prata e adquirem bens, basicamente, por meio de escambo. Moedas são raras, ou, pelo menos, deveriam ser. Apenas os mais ricos e poderosos, nas maiores cidades, dos reinos mais influentes teriam uma economia baseada em moedas.

Mas se basta se aventurar em uma masmorra, lutar contra alguns goblins e orcs para obter uma enorme quantidade de moedas de ouro, por que não há cetenas de aventureiros em cada vila? Afinal, passar anos e anos trabalhando nos campos para nem sequer ver uma moeda de ouro a vida inteira parece estupido se comparada a rica vida de um aventureiro, não é? Como a economia feudal se manteria dessa forma, se a ascensão econômica fosse simples assim e um aventureiro facilmente conseguiria mais riquezas que alguém da baixa nobreza.

Outra coisa que torna essa realidade um tanto estranha é a existência de bens e serviços contratados por aventureiros custando centenas de moedas de ouro. Como em um mundo como esses um "Sábio" ou um "Engenheiro" cobra 50 a 100 moedas apenas por uma consulta? Quem possui dinheiro para comprar um objeto mágico que os aventureiros não desejam por 5000 moedas de ouro? E o que acontece com a economia de um lugar quando um grupo de aventureiros, de repente, aparece com centenas e milhares de moedas de metais preciosos? É um pouco complicado imaginar um mundo medieval, de economia feudal, onde conviva o mercado de escambo, troca de serviços e bens, servidão e outras coisas, com um super mercado de altos valores em moedas de ouro. Aliás, que reino tem tanto poder e ouro para produzir tais moedas em tamanha abundância?

E quanto aos monstros e seus tesouros? Como será que uma tribo de orcs ou um basilisco conseguiu acumular milhares de moedas de ouro? É um tanto estranho eles terem conseguido tamanha fortuna, mesmo que eles tenham saqueado ou matado centenas de homens para isso, já que estariam em um mundo de sociedade feudal. Criaturas com tesouro em moeda provavelmente demoraram muitos anos para acumulá-lo e geralmente, não as terão em grandes quantidades. Uma exceção seriam tesouros roubados de de indivíduos poderosos que se tornaram lendários (como o lendário tesouro do Rei Andarion, roubado pelo Louco Nilbog), ou se roubados de grandes centros de civilização, mas aí, como essas criaturas chegaram até terras civilizadas?

Uma maneira mais sensata de atribuir riquezas a monstros seria colocá-la em forma de diferente, em forma natural, de pedras brutas, ouro não trabalhado, objetos antigos, peles de animais raros, ou mesmo o valor de próprio monstro. Grandes riquezas em ouro e tesouros de moedas deveriam ter uma origem bem pensada. Seja dos cofres do tesouro de um Rei que foi roubado ou das ruínas de uma antiga cidade desaparecida a mais de 1000 anos. Tesouros podem, e devem, ter uma história, uma origem, e uma explicação para estarem na posse de monstros.

Dessa forma, nós podemos começar a pensar um pouco mais em como distribuímos tesouros em nossos jogos. Podemos pensar, na hora de recompensar os jogadores, em como aquilo se encaixa e se relaciona com o mundo medieval em que eles vivem. Tesouros e recompensas, muitas vezes não serão tão extraordinários e podem nem ser sempre em forma de moedas.

Além disso, a grande maioria dos monstros não deve ter muita utilidade para tesouros e moedas brilhantes. Não podemos nos sentir obrigados a colocar uma grande quantidade de ouro como recompensa só porque os jogadores derrotaram nosso lagarto cuspidor de ácido. As vezes, podemos surpreender os jogadores e não dar tanto tesouro quanto eles esperavam receber ou encontrar, e, da mesma forma, quando eles derrotarem um mísero goblin, eles podem descobrir que a criatura estava escondendo uma gigantesca esmeralda em seu bolso. O mundo é caótico e imprevisível. Assim, se quiser que o mundo faça um pouco mais de sentido, pense em como um tesouro ou recompensa foi parar onde está, quem o produziu, e qual o efeito que ele teria em uma economia feudal.

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4 comentários:

  1. Belo assunto e muito bem abordado, parabéns! Normalmente também dou uma história para os tesouros encontrados e em sua maioria tem mais haver com o monstro em questão do que moedas (aquele chifre, veneno ou escamas podem ser bem valiosos para pessoa certa). E se for dar algo mais "substancial" sempre uso pedras preciosas que estão geralmente dentro da barriga do monstro ou espalhado em pilhas de ossos dos aventureiro temerário e confiante. Alem de que um grande tesouro em moedas pesa bastante, geralmente entre 10 à 15g por moeda.

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  2. Então Diogo, a fantasia medieval geralmente é uma grande amálgama de períodos, indo da Antiguidade ao Renascimento. Apesar de visualmente inspirada nas várias Idades Médias da Europa, a fantasia se baseia muito na Grécia Antiga e outras regiões antigas. Nesse período, a moeda era bem mais comum, com comércio praticado em larga escala. A Idade Média diminuiu o uso da moeda, mas em outras regiões (como o império bizantino) ela continuava sendo usada.

    Além disso, temos que considerar o seguinte fator: o escambo era mais usado pelas pessoas de uma mesma região, em geral plebeus e mercadores da Alta IM. O comércio estrangeiro (ou seja, de um reino para outro, ou gente que viajava entre uma cidade e outra - que na época era quase igual a visitar outros países, já que os dialetos mudavam muito no mesmo reino) ainda usava moedas em larga escala - tanto que as pessoas começaram a depositar ouro nas oficinas de ourives e receber títulos (notas promissórias) em troca, quando começou a nascer o dinheiro de papel e demais formas de pagamento (sem falar nos Templários, que eram “bancários”). No “comércio para longe”, nobres tratavam em terras e honrarias muitas vezes, mas só quando os valores eram muito altos ou feitos que transcendiam o uso de moedas, como feitos de guerra. Outra coisa: mercenários geralmente queriam ser pagos em moedas, tanto que a crença comum era que sua lealdade mudava com o tilintar do ouro.

    Claro, nada disso é absoluto para todos os casos e regiões. É apenas uma percepção generalizada histórica da mistureba que usamos na fantasia.

    Sobre aventureiros e grana, vamos pensar que a desigualdade social dessas idades da fantasia era tremenda, em qualquer época. A diferença entre as classes altas e as baixas era bem maior - nobres, burgueses e clero lidavam com valores, bens preciosos e terras que fazendeiros e artesãos sequer sonhavam. Resgates de milhares ou milhões de moedas para reféns nobres feitos em guerra, dívidas externas absurdas, compras de terras em impérios, etc. Então, podemos considerar que aventureiros estão sempre acima da vida comum, lidando com valores que mercenários lidavam, e sempre quebram o equilíbrio comercial quando injetam altos valores de moedas em algum lugar. Já pensou em que sorte de aventuras legais podem rolar, com guildas de comércio mandando mercenários atacarem aventureiros que andam gastando demais e crescendo a demanda além da oferta?

    Agora, realmente os valores praticados no D&D são excessivamente altos, os serviços são superfaturados e os monstros “dropam” tesouros de forma tosca. Por isso mudei a economia do meu cenário para a prata, e considerei que os serviços e produtos mais caros seriam taxados de forma plausível. Um cavalo de guerra realmente custa muito além do que um camponês pode pagar, embora um de tração possa ser comprado depois de muito esforço e economia (ou dado por um senhor feudal em troca de uma banalidade ou talha maior, ou em sociedades menos feudais, trabalho/grana). E os monstros e inimigos, bem, eu sempre penso muuuuito no que seria crível eles estarem carregando. Isso implica em uma frequência bem menor de tesouros monetários, mas os PJs sempre dão um jeito de pegar os tesouros mais sutis (pele de dragão, marfins e tapeçarias, olhos de beholder, etc.). Sei que no D&D essas recompensas são assim para facilitar a “profissão de aventureiro” e eles não ficarem vendendo e curtindo todo couro que encontram, mas enfim, no meu grupo ninguém liga de ser verossimilhante.

    Eita! Falei muito, vou até postar algo pra complementar isso :P

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  3. Pois é cara, acho os valores de D&D muito desproporcionais. Um nau de guerra custa 100 mil PO e uma arma épica chega a um milhão.

    Gostei do novo Reinos de Ferro pois os valores ficaram mais pé no chão. Em D&D, controlar seu tesouro é quase uma aula de contabilidade.

    Pensando nisso uma vez fiz uma matéria sobre o assunto!

    http://redutodobucaneiro.blogspot.com.br/2011/03/salarios-soldo-de-militares.html

    http://redutodobucaneiro.blogspot.com.br/2011/07/dica-de-mestre-invencoes-e-custos.html

    Espero ajudar!

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