terça-feira, 20 de agosto de 2013

Geração de Personagens em RPGs Old School - Reflexões

Como vocês sabem, estou por aí tentando mestrar a maior número de vezes, para o maior número de pessoas que eu conseguir o jogo que eu estou criando com meu amigo Felipe "Pep", o Bruxos & Bárbaros. Isso, normalmente, significa que as pessoas escolhem alguns dos personagens prontos que preparei, e se aventuram a explorar o Túmulo de Tuhan da aventura pronta.

Só que aconteceram algumas coisas que me tiraram da minha zona de conforto. Primeiramente, o pessoal com quem jogo toda semana (sistemas e campanhas variadas, revezando mestres inclusive) queria experimentar o Bruxos & Bárbaros, mas queriam fazer seus próprios personagens. O problema é que eu não passei, ainda, todo o material necessário para criação de personagens para um texto único, unificado, e inteligível, estou fazendo isso agora (e ele será o segundo "preview" Jogo Rápido do B&B). Até aí, nada demais, eu teria, simplesmente que ajudá-los mais que o normal e ir explicando as coisas, e mostrando as várias anotações para eles. As complicações começaram quando eu apresentei as regras padrões de criação de personagens para eles, inspirada no jogo de fantasia original e suas versões mais clássicas.

Ao contrário da maioria dos RPGs de hoje em dia, há um forte fator aleatório na criação de personagens dos jogos ditos Old School. Ao invés de se pensar no personagem por inteiro antes, e traduzir esse conceito para o papel, nesses jogos o personagem vai se desenvolvendo no jogo, e você deve criá-lo de acordo com o que o jogo te proporciona. Um do jogadores veio para mim com um histórico completo do personagem, bem complexo, e tudo mais. Bem interessante, mas tive que lembra-lo que era possível que o resultado dos dados dele não tornasse viável aquele conceito que ele criou. Na minha concepção, uma das características desses jogos é justamente a aleatoriedade e improvisação, você só saberia exatamente com que tipo de personagem iria jogar depois que rolasse os dados e criasse o conceito dele depois disso.

A primeira coisa que um jogador faz é gerar os valores dos atributos do personagem. Tradicionalmente isso é feito rolando-se 3d6 em ordem, para cada um dos atributos. Assim, valores de 3 a 18 são gerados para Força, Destreza, Constituição, Inteligência, Sabedoria, e Carisma. A partir desses valores o jogador vai começando a visualizar o personagem, se ele é forte ou fraco, ágil ou desajeitado, inteligente, ou inculto, e coisas do tipo. Com base nisso, ele vê em quais conceitos, classes, e raças o personagem seria mais apropriado, e pode até ir contra essas "vocações" (os atributos não tem um peso tão forte, e modificadores tão significativos assim na maioria desses jogos). É como se a criação do personagem dependesse do jogo em si, e qualquer pré-concepção não valesse.

Isso me leva a outro ponto que acho diferente nesse estilo de jogo. Ao invés de um grande e complexo histórico para o seu personagem, falando de sua façanhas passadas, e um série de acontecimentos que o torna especial, o passado nesses jogos não recebe tanta atenção. Os personagens começam bem inexperientes, e as coisas mais interessantes e excitantes de suas vidas ainda estão para acontecer (são as aventuras). Ao contrário de ter um passado detalhado cheio de desaventurar, conflitos e outras coisas antes de começar a jogar, a regras é você vivenciar esse passado. É claro que ele pode não sair do jeito que você imaginava, mas a graça é justamente essa surpresa.

Enfim, nesse tipo de jogo, a surpresa e a improvisação são fundamentais. Com uma taxa de mortalidade maior, e um sistema que tende a não poupar personagens, esse tipo de criação de personagem mais rápida, e em que as coisas são criadas na hora se faz necessário e bastante lógico. Sendo os personagens, via de regra, inexperientes, um histórico detalhado e cheio de elementos não faz muito sentido, permitindo uma criação aleatória, e desenvolvimento de sua história através do próprio jogo.

Mas vejam bem, essa não é a única maneira de se criar personagens, nem a melhor. É apenas a maneira tradicional desses jogos de lidar com isso. Eu a acho bastante interessante, se encaixa muito bem no estilo de jogo que eu gosto, e faz bastante sentido no contexto das regras também. Aliás, como eu já falei em outro artigo, acho que é uma das semelhanças que os RPGs Old School tem com alguns jogos narrativos que prezam pela improvisação e surpresa. Entretanto, é claro, nem todo mundo vai querer jogar assim. Depois de anos e anos tendo praticamente controle absoluto na hora de criar o seu personagem, alguns jogadores se sentem castrados e tolhidos de suas escolhas nesse método. Compreensível, mas acho que é interessante para qualquer um experimentar esse estilo de jogo e lidar com suas características. De certa forma, acho ele até libertador, já que você não precisa pensar muito sobre o que vai fazer, já que o destino vai te fornecer alguma coisa para você trabalhar.

O grupo com que eu jogo semanalmente não é necessariamente fã de jogos Old School, e senti que alguns não curtiram muito o método tradicional de criação de personagens. Tentei convencê-los a experimentar esse método mas não sei se fui bem sucedido. Como eu não quero forçar nada a ninguém vou ver se eles querem fazer os personagens de outra forma. Afinal, o importante é se divertir, e a minha maneira de se divertir não é melhor do que a de ninguém.

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14 comentários:

  1. Isso é complicado mesmo.

    Eu por exemplo, não me importo de gerar atributos aleatórios. Ainda mais no B&B que os modificadores não são tão cavalos.

    O problema, é os atributos gerados restringirem as classes as quais você pode pertencer. Eu, por exemplo, não me importo de jogar com guerreiro, bárbaro ou ladrão. Mas ser forçado a jogar com clérigo ou mago seria muito chato para mim.

    Imagino que o mesmo ocorra com quem curte só conjuradores.

    No B&B, terá restrição de entrada em classes por atributo? Talvez uma das conjuradoras, uma das especialistas, e uma das porradeiras sejam as isentas de restrição eim... que aí não obriga o cara a jogar com um estilo que não quer.

    Talvez o guerreiro, o explorador, e o mago? Supondo esses pois shamãs e bárbaros teriam mais uma coisa inata do que treinamento.

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    1. Restrição, restrição, não vai ter. Mas recomendo que se tenha pelo menos 8 no valor do atributo principal daquela classe. Isso foi outra coisa proposital que eu fiz. Como queria que, de forma padrão, os atributos fossem aleatórios, deixei que qualquer um pudesse ser qualquer classe, mesmo que não tivesse "vocação" para aquilo.

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    2. Ah, então tá resolvido!! :)

      Dá para ser da classe que quiser, já tá ótimo. Mesmo porque os modificadores não são gritantes.

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  2. Oi Diogo, eu nunca tinha entendido o valor dessa aleatoriedade toda. Foi só lendo o D&D do Tom Moldvay que a ficha caiu: esse jogo não é como os rpgs comuns. Nele o Jogador importa mais do que o Personagem. É o Jogador quem é Desafiado, ele que precisa vencer a masmorra (e o personagem é a interface de interação com o mundo imaginário).

    Pra mim o D&D basic set (Moldvay) não é nem rpg. É um jogo próprio (do qual os rpgs se inspiraram). Esses elementos caóticos na criação do personagem são pra minimizar decisões na criação do personagem - quando mais rápido e fácil pra se criar melhor. O importante é como o Jogador resolve os desafios e não os antecedentes do personagem.

    Nesse sentido ele é exatamente o oposto dos storygames - como o Burning Wheel, o Fate e os derivados do Apocalypse World. Nos storygames os personagens importam (não que precisem de antecedentes) e os desafios são criados a partir dos personagens e não aquém deles.

    Claro que, cada grupo investe na ficção a sua maneira. E o fato do Desafio vir antes da História, não significa que ela deva ser desprezada.

    Nunca fui fã do D&D mas depois de ler a caixa magenta minha visão sobre o jogo mudou. Esse D&D que li é um jogo único. Eu não jogaria ou narraria (eu gosto mesmo de story-games) mas o jogo me impressionou demais (o engraçado é que eu já tinha lido vários retro-clones e o old school primer e não tinha achado nada demais).

    Enfim, valeu tudo isso pra te perguntar. Qual o foco do Bruxos & Bárbaros? (Não terminei de ler o jogo rápido ainda, hehehe). Por que se o foco for 'Desafios e Jogadores', acho uma ótima escolha ir pra rapidez e aleatoriedade. Quando mais rápido eu puder entrar em ação melhor!

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    1. Fagner, lecando em condideração que o D&D Basic do Moldvay é a minha versão favorita do jogo, e ele é a principal inspiração do B&B, o foco é esse mesmo. O personagem é o maio pelo qual o jogador atua. Sem o jogador, não há personagem, e muito vai depender mais dele do que as coisas que estão na ficha.

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  3. Ótimo texto cara, mas acho que valeria você ter dito uma coisa a mais sobre o Bruxos e Bárbaros, que provavelmente diminua ainda mais a importância dos atributos, os tais Aspectos, talvez um personagem feito (raça e classe) e os atributos baixos mas aspectos bem escolhidos, desempenhe bem o papel que o jogador escolheu, por mais que seus atributos não sejam tão adequados...

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  4. Gostei do texto. Nos meus grupos de AD&D sempre tentei convencê-los disso. Mas não usavamos o método do 3d6 e sim do 4d6. No início era fácil, mas depois os jogadores começaram a ficar mais chatos, mas ainda consigo manter esse método, mas tive que abrir algumas liberdades para eles ordenarem os valores (não seguindo a ordem For, dest, etc) para eles poderem fazer as classes q eles querem. São raros os jogadores que não se importam com isso e aceitam na boa o velho e bom método do 3d6.

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  5. Obrigado pela informação Diogo, pois eu não via muito sentido neste tipo de geração de atributos até ler seu post. Apesar disso, gosto de dar a liberdade para os jogadores escolherem como querem distribuir as suas habilidades.

    Contudo, nos meus jogos não costumo incentivar grandes históricos, afinal você não é um grande herói ou famoso aventureiro, você é apenas mais que está tomando a estrada da mort... digo das lendas.

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  6. Este comentário foi removido pelo autor.

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  7. Diogo. Eu acho que você sentiu a mesma coisa que eu senti ao tentar implantar este método aqui. Eu até desisti, pois todos preferem ter a liberdade total.

    Eu já parei de argumentar faz tempo, mas eu vejo que isto limita tanto as possibilidades que a aleatoriedade pode trazer para o jogo. Infelizmente nem todos conseguem perceber o quanto isso eleva as capacidades de improviso dentro do jogo.

    Mas é isso. Eu acho que poucas pessoas vão utilizar este modo de jogo, mas é super interessante. Eu já construí personagens memoráveis usando este método que jamais teria pensando em fazer usando a "liberdade" de escolha.

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  8. Eu ja narrei e ja joguei com geracao de atributos tensa, tipo 3d6 na ordem, sem poder mudar nada!

    mas acho q nao veria problema nenhum em se re-rolar os dados algumas vezes...

    eu acho q cabe ate uma regra caseira. Cada vez que vc re-rolar os dados eu tiro 5% da sua XP até o nivel 5!

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  9. Cara, nunca gostei desse método aleatório mas com esse ponto positivo dele talvez vc me convença a adotá-lo.
    Muito bom post!

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  10. Nunca pensei neste aspecto da aleatoriedade, na verdade quando desenvolvi o Profecia-RPG, utilizei um sistema de distribuição de pontos onde se determina uma pontuação total para os atributos, outra para as habilidades (parecido com GURPS, StoryTeller e outros) e o jogador distribui estes pontos como deseja. É ótimo para personagens que já tem um histórico e mantém o grupo equilibrado, mas no caso de personagens iniciantes o tempo gasto para montar a ficha é alto e os personagens acabam ficando todos muito parecidos.
    Gostei da ideia, já estou até pensando em rever as regras do Profecia e adicionar uma regra opcional para aleatoriedade.
    Parabéns pelo post.

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  11. Pois é, acho que se esse apelo de "criação de personagem para o improviso" fosse a forma como o jogo se vendê-se ao invés de "criação de personagem tradicional" (para alguns, tradicional = chaaato), metade dos problemas quanto a resistência dos jogadores ía ceder.

    Eu pessoalmente gosto, para mim não é a melhor forma, nem uma forma necessariamente "old school", é apenas mais uma maneira de se criar personagens em jogos. E como todas as demais maneiras de se criar personagens, tem qualidades e defeitos.

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