Arte de Jon Hodgson |
Como muitos sabem, nesses jogos normalmente não há uma lista precisa de perícias, talentos, e outras coisas que definem exatamente todas as capacidades de um personagem. Além disso, muito se fala em desafiar além do personagem e suas estatísticas, o próprio jogador, e sua habilidade de jogo. Sendo assim, eu vejo certas estatísticas na ficha de personagem como meros elementos indicativos, mas não restritivos. Um personagem depende, para mim, mais de como o jogador o interpreta, de como ele faz as suas escolhas, do que o que está escrito na sua ficha. Assim, uma mesma ficha de personagem pode resultar em "pessoas" bastante distintas se dadas a jogadores diferentes.
Dessa forma, eu vejo os atributos mentais e sociais dos jogos D&Dísticos (geralmente Inteligência, Sabedoria, e Carisma), como apenas indicadores e potenciais, e que influencial só até certo ponto o desempenho de um personagem. Eles já tem seu papel dentro do jogo, e mecânicas representando esses papeis, bem estalecidos, e para mim só vão até certo ponto para definir as características mentais e sociais dos personagens. Dá mesma forma que o atributo constituição não define o quão corpulento você é, ou como você vai usar seu corpo criativamente, acredito que esses números não devam limitar o uso criativo do personagem pelos jogadores. Abaixo vou falar individualmente sobre cada um deles e como eu os vejo nas minhas mesas.
Inteligência: Esse é o atributo do conhecimento, memória, e compreensão de assuntos mais complexos. Em termos de jogo, esse atributo indica quantas línguas adicionais o personagem sabe falar, se ele sabe ler ou escrever, qual é a sua capacidade para aprender e conjurar magias, e é usado muitas vezes, para ver se o personagem sabe ou se lembra de alguma coisa, como uma lenda, um fato histórico e outras coisas. Mas para mim, as coisas para por aí. Eu não peço um teste de Inteligência para um personagem decifrar um código, responder a um enigma, ou resolver um problema. Eu peço para o jogador resolver isso com suas próprias habilidades. Será que isso é injusto? Não sei, mas eu não ligo. Acho muito mais divertido resolver isso com os jogadores deixando o dado de lado. Veja bem, eu encaro isso de uma forma bem objetiva. Um mago com inteligência 18 pode ter acumulado um conhecimento incrível, pode falar diversas línguas, e ser capaz de compreender as mais poderosas magias, mas na hora de resolver um enigma, ele pode se atrapalhar, pode ter um raciocínio não muito rápido e tal. Dá mesma forma, um bárbaro das estepes do norte pode não saber nem ler, desconhecer os anais da história, mas mesmo assim ter uma mente bastante afiada, perceber padrões facilmente, e outras coisas, não? Um jogador não tem como ter os conhecimentos sobre o cenário, decorar todas as lendas do mundo, e fatos históricos do cenário, mas ser capaz de raciocinar, decifrar enigmas e ter ideias criativas ele pode, daí a necessidade de ter um atributo mental para isso.
Sabedoria: Ela representa, geralmente, a força de vontade do personagem, sua ligação com o mundo ao seu redor, e sua compreensão de verdades universais e a fé. Em jogo ela tem a capacidade de lhe proporcionar bônus para resistir a magias, de dizer se o personagem é capaz ou não de se tornar um sacerdote e receber bençãos de seu Deus, e é usado para determinar o quão perceptivo é o personagem. Mas, novamente, para mim, isso para por aí. O jogador na minha mesa ainda vai ter que dizer onde ele está buscando por alguma coisa, ainda vai ter que usar o próprio bom senso pra decidir o que fazer, e a sua própria sabedoria para saber se uma pessoa está mentindo ou não é o que vai contar. De novo, isso é justo? Vai saber, mas acho bem mais divertido do que simplesmente rolar um dado e falar "você percebe que ele está mentindo". Enfim, acho que o atributo já possui usos o suficiente dentro do jogo, não precisando substituir um jogador naquilo que ele pode contribuir ao jogo.
Carisma: É aquele atributo que simboliza o magnetismo pessoal do personagem, sua capacidade de causar uma boa, ou má, primeira impressão, e sua aptidão para liderar e transpassar lealdade. No jogo, ela vai determinar o numero máximo de seguidores que o personagem consegue liderar, um ajuste de reação inicial para quando encontrar NPCs (tipo, primeira impressão), e um bônus ou penalidade inicial à lealdade de seus seguidores. Mas é por aí que paro também. Carisma é algo mais instintivo e potencial do que qualquer outra coisa para mim. Ele ajuda a determinar as condições iniciais de uma situação social, mas depois disso a responsabilidade é de cada jogador. Quando ele encontro o contrabandista com o qual espera negociar, o atributo ajuda a determinar a reação inicial do NPC, mas depois disso, vai caber ao jogador utilizar-se da situação ou alterá-la ao seu favor. A mesma coisa é com seus seguidores. Ele pode possuir a capacidade de atrair vários deles, mas a habilidade de mantê-los fiéis e liderá-los bem vai depender das ações que o jogador tomar.
Enfim, como eu tentei passar com isso, eu levo em consideração sim os valores dos atributos mentais e sociais, mas só até certo ponto. Depois dali, acredito que o personagem está na mão do jogador. Isso limita as possibilidades de alguns jogadores que não conseguiria fazer essas coisas sem contar com as "habilidades" de seus personagens? Pode ser. Mas para mim é muito mais divertido depender de outras coisas que não só os dados na mesa o tempo todo. Essa é a maneira certa de lidar com essas questões? De forma nenhuma. Talvez seja a maneira certa para mim, a qual eu me divirto mais, que acho mais interessante. E vocês? Como lidam com essas questões nesses jogos?
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Bem interessante sua visão!
ResponderExcluirConcordo com você em grande maioria do texto.
Ótimo texto!!!
Grande abraço e até mais!!!
Valeu Lyonn! E o que você faz diferente?
ExcluirUso basicamente a mesma abordagem, contudo, quando vejo que os jogadores estão perdidos, costumo liberar alguns testes!
ExcluirJogo muito em eventos com jogadores novatos e eles as vezes podem não sentir tão a vontade ou não captar tão bem o espírito da coisa. Nesses casos, as vezes permito testes a fim de dar pequenas dicas para que ele possa então resolver o resto usando o roleplay!
Muito bom o texto. Esse tema de "O que o jogador e o personagem sabe" sempre é interessante. Concordo com a visão dos atributos como potencialidades e da valorização do jogador sobre o personagem, mas gosto de valorizar a classe do personagem, fazendo-o se sentir útil em sua escolha.
ResponderExcluirVlw
Sem dúvidas, Ricardo. Algumas coisas eu nem peço testes com base na classe dele. Por exemplo, um feiticeiro pode identificar uma linguagem arcana antiga automaticamente, mesmo se não conseguir compreendê-la totalmente. Um bárbaro vai saber se virar no mato, ou terá mais facilidade que os outros personagens, e essas coisas.
ExcluirÉ, eu sou da escola exatamente contrária :).
ResponderExcluirNas minhas mesas, atributos mentais (e atividades relacionadas) são levados da seguinte maneira.
-Sua descrição de ação e intenção lhe ajudam até certo ponto, mas os atributos do personagem influenciam fundamentalmente nas decisões.
---Por exemplo, ao tentar convencer um NPC a realizar um favor para seu personagem, os argumentos que você (jogador) realizar têm peso fundamental para verificar a reação e a necessidade de testes. Um argumento fantástico e bem embasado pode fazer negligente a necessidade de um teste. Um desastroso pode garantir uma falha na tentativa. Qualquer coisa entre esses dois extremos pediria uma rolagem posterior à sua descrição - e as suas escolhas podem lhe garantir bônus ou penalidades.
---Não deixo desafios lógicos serem definidos por uma mera rolagem - a menos que o desafio em si seja algo pouco importante ou relevante para a narrativa ou aventura em si. Como classicamente "old school", certos problemas são intencionados para os -jogadores-. Ainda assim, os jogadores podem usar suas skills para obter pistas ou direções - um teste de inteligência feito pelo mago pode não lhe dar a solução de um "puzzle", mas pode te dar uma pista.
---Conhecimento segue tradicionalmente atrelado aos atributos e perícias do personagem. Você, jogador, pode conhecer um "troll", mas será que o seu personagem já ouviu sobre eles? Você, jogador, pode não fazer idéia do monstro que esteja enfrentando, mas será que o seu personagem já ouviu falar sobre ele? Enfim, usualmente, esse tipo de "conhecimento que o personagem PODERIA ter" para mim pede um teste. Novamente, como no primeiro exemplo, se a frase mudar para "conhecimento que o personagem CERTAMENTE teria" ou "conhecimento que o personagem JAMAIS teria", não há necessidade de rolagem. Uso o dado quando há potencial para diferentes respostas - respostas ou argumentos garantidos não são influenciados pelos dados. Logo, se um monstro aparece e é algo que ninguém nunca viu, não há "rolagem" para conhecimento do monstro. Por outro lado, se um monstro aparece é algo que decerto seu personagem já teria visto (como um anão que foi membro de um exército famoso por suas batalhas com orcs), não há necessidade de rolagem. Situações entre os dois extremos pedem rolagens, com bônus e penalidades nos lugares devidos...
---Os testes de "busca" e de "percepção" caem na mesma filosofia acima. Você pode realizar testes de perícia para procurar coisas ou obter pistas, mas sua descrição anterior é fundamental para definir a necessidade dos testes ou bônus e penalidades.
O "objeto passível de ser encontrado" pode ser o mesmo, mas as ações dos jogadores é que definem se há chances de sucesso ou falha e/ou se há necessidade de rolagens.
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Enfim, no meu estilo de jogo, trabalho mecanicamente com os atributos e influenciando o jogo e suas possibilidades. Entretanto, como no restante do RPG, descrição e circunstâncias geram modificadores na parte "matemática" em si - desde bônus e penalidades até sucessos ou falhas automáticas.
Espelhando o Diogo - não é algo que é "melhor" ou "pior" do que qualquer outro estilo, é meramente como eu prefiro que as coisas aconteçam no RPG! ^^
Então, Vinícius. Quanto a parte de conhecimento eu faço igualzinho a você, embora dificilmente eu vá deixar o personagem saber tudo sobre um local ou monstro. O resto que eu faço um pouco diferente.
ExcluirQuanto a busca por coisas escondidas, eu só deixo fazer se descrever onde está procurando e como. Se descrever tão bem que não tem como não achar a coisa, eu nem rolo, ele acha (mas se não, rola o teste). Mas uma coisa que eu não permito é "dou search na sala". Isso não rola. Heheheheh
Mas é isso aí. O seu jeito de jogar é mais um meio termo mesmo. Legal.
Ótima postagem, Diogo.
ResponderExcluirAntigamente eu era muito mais dependente dos dados, hoje, não interpreto as coisas de forma muito diferente do que você escreveu.
Abraços!
Valeu, Leo! Dependendo do jogo até faço diferente (aqueles que tem perícias para essas coisas). Mas nos jogos D&Dlike eu faço assim mesmo.
ExcluirMuito muito muito boa postagem!!! Vou salvar um pdf aki incluindo os comentarios que tambem achei muito legal!!! Acho muito legal discussões assim, ainda mais pra mim que sou novato como mestre e as vezes eu fico meio perdido. As vezes a minha intenção é ser dar prioridade a interpretação mas na pratica fico meio perdido e deixo o sistema dominar minha narração... Mas posts assim me ajudam muito a ser um mestre melhor!
ResponderExcluirMuito obrigado por nos passar experiencia Mestre Diogo!!!
Valeu, Hebert! Obrigado por palavras tão bondosas. Mas eu sou um aprendiz como qualquer outro. A cada RPG que leio, sessão que jogo e pessoa que eu conheço vou aprendendo um pouquinho e moldando meu jeito de jogar. Acho que isso é normal né? Todos nós vamos aprendendo. :)
ExcluirBem, eu ja acho que se o jogador comprou o atributo ele tem direito a usa-lo no jogo.
ResponderExcluirAté pq a gente não basei os atributos fisicos e a capacidade de combate dos personagens do atributo do proprio jogador, então não vejo pq fazer o mesmo com o outros.
O jogador pode não ser a pessoa mais carismatica do mundo, mas seu bardo elfo pode ser, e acho que um dos motivos de jogarmos rpg é justamente sermos mais heroicos do que somos na vida diaria.
Entendo o seu posicionamento. Mas veja bem, esses atributos já tem uma influência bem significativa e definida no jogo. Eu não ignoro essas coisas. Eu só acho que outros aspectos ficam mais interessantes quando o jogador participa ao invés de rolar um dado.
ExcluirAté porque a utilidade de um atributo físico é bem mais limitada do que um atributo mental, pelo menos ao meu ver. Mas há quem prefira não exigir isso de seus jogadores. Normal.
Esse negócio de um mesmo personagem agir de forma completamente diferente dependendo de quem interpreta é verdade até em jogos mais simulacionistas. Acho que isso se deve ao fato de que, mesmo com perícias e talentos, a interpretação transcende (ou deveria) a ficha.
ResponderExcluirO que quero dizer é que nós não conseguimos sair completamente do nosso jeito de ser quando estamos jogando. Pra um cara calmo e passivo é bem mais difícil interpretar os "culhões" de um bárbaro "machão". É por isso que esse equilíbrio proposto pelo Diogo (pra mim) é o melhor, estamos representando personagens, mas ainda somos nós jogando (ou seja, não somos atores).
Meio embananado o discurso, mas espero me ter feito entender :P
Eu tenho um problema, e queria sugestão.
ResponderExcluirVárias vezes meu personagem tentou intimidar algum NPC inculto e com muitos dados de vida a menos que meu personagem. Mas como "intimidação" é baseado em Carisma, é o equivalente àquele capanga do hortifruti com 1 nível de classe de NPC ver um combatente 2:10m de full plate com uma espada bastarda flamejante vaporisar em 15 segundos seus dez companheiros e ainda assim não ter medo dele porque ele treinou por anos mais para bater em inimigos do que para parecer ser capaz de bater em inimigos!
Qual a melhor solução? Roleplay, bom senso, ou uma rolagem de dados?
Bem, bom senso temos que ter em todos os casos. Quanto a rolar dados ou fazer no rolepay, vai depender de cada grupo. Eu, nos jogos estilo Old School, prefiro fazer no papo mesmo, sem rolar dados além da reação inicial. Se o argumento do personagem fizer sentido e for bem passado, eu considero ele como NPC e tento enxergar a situação como se fosse ele.
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