sexta-feira, 7 de julho de 2017

Jogando no estilo Hexcrawl



É um jeito antigo que surgiu para jogar D&D como alternativa às aventuras focadas em dungeon. Que tal explorar o mundo em vez de pular de masmorra fétida em masmorra fétida?

Ponto de Partida


Em um jogo de Hexcrawl, o mestre começa criando a área inicial onde o grupo começará a aventura, podendo contar com a ajuda dos demais jogadores para popular este ponto, aproveitando as origens dos personagens feitos para a aventura.

É importante ter um local de origem para ambientar a aventura e para colocá-lo como ponto de referência: é para lá que os personagens retornarão para gastar seus tesouros, procurar repouso, cura, treino e pistas para novas aventuras.

Não é necessário, porém, detalhar excessivamente este local, porque não queremos que o ponto de partida tenha muita “gravidade”, de forma a atrair o foco da história para si. Queremos que os jogadores saiam em jornada constantemente.


Explorando o mapa hexágono a hexágono


O mapa é um ponto fundamental para o Hexcrawl. Ele tem esse nome porque utiliza mapas divididos em hexágonos, que se tornaram bastante icônicos para o RPG como um todo, e você já deve ter visto por aí.

Em um hexcrawl, cada hexágono é numerado e identificado, e deve ter um “feature”, algo que o destaque dos demais. Ruínas, um acidente geológico, uma zona de magia morta, uma vegetação diferente, um assentamento, uma ponte perigosa ou qualquer coisa que o diferencie dos demais hexágonos.

Os hexágonos servem também para medir melhor as distâncias. A proposta aqui não é pular as viagens e concentrar nas cenas; o foco é viver o caminho, portanto precisamos saber o tempo que isso leva. Estamos falando aqui em viver o dia a dia das jornadas, as dificuldades envolvidas, os encontros aleatórios possíveis e as surpresas que o destino guarda.



Abrace a Aleatoriedade


Lema dos RPGs old-school, abraçar a aleatoriedade é prática fundamental no Hexcrawl. O mundo é conhecido hexágono a hexágono, mas o mestre não precisa inventar tudo que há em cada um deles. Ele pode criar tabelas de features e encontros aleatórios para cada ecossistema, rolando aleatoriamente o que o grupo encontra e o que passa, assim, a fazer parte do mundo conhecido, de forma que seja mais fácil cruzar com worfs famintos à noite em uma floresta sombria do que de dia no deserto, por exemplo.

Em cima das informações que os dados trouxerem, o mestre pode preparar um repertório de cenas e encontros para alimentar a exploração do grupo ou pode improvisar na hora, conforme a necessidade.
Por exemplo: imagine que as tabelas apontam que, em determinado hexágono de uma região desértica, há um oasis onde se encontra um leão. E que este leão guarda um tesouro de algumas moedas de ouro e se comporta com agressividade de início.

O mestre pode decidir que uma caravana entrou no território de um leão do deserto e foi por ele trucidado, restando algumas moedas de ouro que os audazes comerciantes carregavam de volta pra casa.


Sandbox


A solução pode ser contornar o local e evitar o leão simplesmente, mas pode ser também uma oportunidade de arrumar algum ouro e, com sorte, descobrir uma rota de comércio pelo deserto que pode ser explorada pelos personagens no futuro. Uma espada mágica que o grupo descubra pode ser também de alguém que morreu na caverna explorada. Foi encantada em algum contexto e serviu para algum feito no passado; pode ser cobiçada por alguém, pode ser uma história a se descobrir.

O mundo que vai sendo criado torna-se assim vivo, evoluindo naturalmente, conforme são desenvolvidos os ganchos que surgem espontaneamente com a experiência da mesa. O mestre assume um papel narrativo de preparação de repertório e reação aos jogadores.



Desequilíbrio


Este mundo, por ser vivo, traz encontros que só precisam ser coerentes com a região em que ocorrem e com o cenário em que se encontram. Não há qualquer necessidade de serem equilibrados com o nível do grupo.

Da mesma forma que um grupo de level 1 pode encontrar um dragão caso meta o nariz no lugar errado, um grupo de level 18 pode cruzar com ridículos salteadores goblins.
Lutar com um dragão nestes termos é morte certa; matar goblins assim é absolutamente fútil, principalmente quando eles podem ser utilizados de boi de piranha na masmorra daquele arquelich bizarro, abarrotada de tesouros da qual tiveram que fugir já duas vezes.



Gestão de Recursos


O grupo em vez de enfrentar tudo que vê pela frente, passa a evitar combates que podem levar à morte ou dos quais podem conseguir extrair recursos para suas jornadas. Comida, água e a gestão do tesouro passam a ser assuntos importantes. 

Carregar muito ouro pode fazer a viagem durar muito mais, levando a um consumo maior de rações, água, tocha e outros recursos que, à míngua, podem causar problemas e desafios por si só, principalmente se somados aos desafios que ambientes inóspitos como florestas ou geleiras trazem.

Súbito, não só as magias de dano do mago e as magias de cura do clérigo passam a ser importantes. Em uma aventura de hexcrawl, é comum você ver o mago decorar magias que costumam ser jogadas para escanteio como Tenser’s Floating Disc e Create Food and Water.



Old School


A gestão de recursos em um hexcrawl se torna ainda mais importante quando pensamos que o estilo era mais famoso na época dos D&D antigos, quando não existia cantrips infinitos, os personagens tinham menos pontos de vida e muitos monstros tinham poderes que levavam a um “save or die” (poison de wyvern? morte certa).

Outro traço dos D&D antigos que casam perfeitamente com o estilo é a recompensa. A principal fonte de XP na época era tesouro, e não matar monstros. Até o peso dos personagens era medido em CNs, que é o peso de uma moeda de ouro.

Por isso o jogo vem sendo resgatado pelos entusiastas da OSR (old school revival), que resgatam as versões de D&D dos anos 70 e 80, adotam os sistemas chamados retroclones, ou aderem a propostas daí derivadas, como Lamentations of the Flame Princess, Labyrinth Lord e Dungeon Crawl Classics, este lançado pela Editora New Order em pt-br recentemente.

Hoje já encontramos lá fora cenários de hexcrawl excelentes, como Carcosa, Isle of the Unknown e Blackmarsh (gratuito no DrivethruRPG), este último inspirado numa campanha clássica das antigas, chamada Westmarches, que é referência para o estilo.



Hexcrawl Moderno


Se você não quer abrir mão de jogos mais novos mas curtiu a idéia do hexcrawl, há gente adaptando o estilo para novos formatos. Tem material em inglês para Pathfinder, como o Hexcrawl Chronicles, e para D&D 5e, como o Hexbox e parece funcionar, apesar de perder muitas características exploradas neste artigo.

Há blogs excelentes sobre o assunto, também gringos, e uma boa referência é o Ars Phantasia, que compila vários artigos e informações sobre o estilo.

Se você entende bem o inglês falado, há videos interessantes sobre o estilo de jogo do Westmarches e inspirados nele, como este video do Matthew Clolville, esta série do Stephen Lumpkin criando uma campanha, e este gameplay do Roll Play.

Em português, temos uma campanha de hexcrawl OSR chamada Ouro & Glória, transmitida ao vivo no canal de Twitch Perdidos no Play, utlizando o Dungeons & Dragons Rules Cyclopedia.

Boa exploração!



2 comentários:

  1. Muito bom!!!!! Irei adotar esse estilo em uma próxima campanha, estou treinando minha improvisação, portanto acho que vai ser bacana eu adentrar no Hexcrawl futuramente.

    ResponderExcluir
  2. Caraio galera, conteúdo de qualidade. Parabéns

    ResponderExcluir